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Pizzicato Five

Sendo um dos mais famosos projectos musicais fora do Japão, os Pizzicato Five (ou P5) são ainda hoje, passados cerca de cinco anos desde o término das actividades como colectivo, a referência maior do chamado Shibuya-key, ‘movimento’ musical (e com muitos aspectos relacionados com design), que surgiu na zona comercial trendy de Shibuya (Tóquio).

Englobando nomes sonantes como Flipper’s Guitar (duo composto por duas figuras chave, Keigo Oyamada, mais conhecido por Cornelius, e Kenji Ozawa), Fancy Face Groovy Name (banda que revelou Kahimi Karie e Takako Minekawa) ou Fantastic Plastic Machine, o Shibuya-key, actualmente mais um rótulo comercial, englobava um grupo de artistas, muitos deles com mais do que uma ‘ocupação artística’, numa atitude e estilo de vida tão despreocupada e artística como pretenciosa e escapista, que encontrava em elementos Retro-Kitsch a sua principal fonte (inesgotável) para tentar reformular a cultura pop japonesa, juntando a isso uma forte influência de elementos pop (a maioria exteriores ao Japão), quer musicalmente quer visualmente.

A génese dos P5 dá-se quando este movimento começou a dar os primeiros passos, na altura ainda sem o reconhecimento que adquiriu nos anos 90, usando as mesmas e inúmeras referências da música pop anglo-saxónica nos anos 60, do Lounge/Easy Listening e das bandas sonoras dos 60 (sobretudo do cine beat), da música ye-ye francesa ou de compositores como Burt Bacharach e Serge Gainsbourg, combinando por vezes com essas influências sons mais electrónicos, que depois marcariam algumas das variantes da Club Scene dos 90. A ‘atitude visual’ da banda acompanhava estas influências sonoras, como de resto todos os envolvidos no Shibuya-key, misturando diversos elementos Kitsch dos anos 60, criando uma amalgama arty que revelava simultaneamente uma visão ironicamente divertida como pretenciosamente séria em relação a esta reciclagem pop.

O grupo começou a ser pensado em 1979, quando Yasuharu Konishi e Keitaro Takanami, ambos estudantes da universidade de Aoyama, uniram esforços para criar um projecto musical que revelasse os seus gostos em comum pela pop de contornos mais retro e que simultaneamente conseguisse ter uma presença visual metodicamente assente nos mesmos padrões. Apesar desta união de esforços nessa altura, foi apenas em 1984 que nasceu oficialmente o grupo, com a adição de Ryo Kamamiya, da vocalista Mamiko Sasaki e de Shigeo Miyata, que abandonou o grupo poucos meses depois.

Mesmo reduzidos a quatro elementos os Pizzicato mantiveram o ‘five’ no nome e lançaram o seu primeiro single, “Audrey Hepburn Complex”, revelando uma das “referências cinematográficas” que sempre estiveram presentes na carreira da banda, e em 1986 o primeiro Lp “Pizzicato Five in Action”, que gerou críticas favoráveis, logo seguido de “Couples”, com modesto número de vendas, mas que mostrava já que a dupla Konishi/Takanami estavam já à perto de conseguir canções pop perfeitas, com recurso ao uso de elementos que até então eram considerados demasiado ‘pirosos’ e nostálgicos para serem considerados comerciais.

Embora mantendo uma existência fluída, a banda começou a ter mudanças de line-up constantes até ao início dos anos 90, muito devido a pressões comerciais da CBS SONY (a editora da banda nesses primeiros anos), tendo apenas Konishi e Takanami se mantido como membros centrais e principais compositores da banda. Com a inclusão de Tajima Takao como vocalista, que gravou com a banda o album “Belissima!” (em 1988), os P5 começaram a ganhar maior relevância no panorama pop nipónico, assinando algumas bandas sonoras para série de dorama e outros projectos “comerciais”, sobretudo para publicidade, sobretudo devido à cada vez maior relevância de Konishi como produtor musical.

Mas foi apenas no ano seguinte que se dá a maior mudança na banda, e que começou verdadeiramente a carreira internacional dos P5, com a inclusão da carismática Nomiya Maki, que primeiro deu voz a “Satellite Hour”, faixa incluída em “On Her Majesty’s Request” (1989) e depois, devido à desistência de Tajima (para se dedicar em full time ao projecto Original Love), se assumiu como a figura central da banda em 1990 nos albuns “Soft Landing on the Moon” e “Lover’s Rock”. Desde logo ficou patente que o trio Konishi, Takanami e Maki possuiam um entendimento perfeito sobre o que poderia ser o caminho da banda, algo que desde logo ajudou o futuro da banda nos anos seguintes e ajudou a uma ‘mudança’ de editora, com um contracto discográfico a Columbia (Japão)/Triad.

Os anos entre 1993 e 1995 foram os anos da ‘Pizzicato Mania’. O uso de “Sweet Soul Revue” na campanha da Kanebo Cosmetics e de outros temas em séries e programas televisivos, valeu aos à banda o sucesso discográfico do album “Bossa Nova 2001” (1993), que atingiu directamente o número 7 nas charts japonesas. No início de 1994 um contracto com a Matador, label de referência no universo indie nos EUA, permitiu aos P5 lançar “Five by Five” (a.k.a. 5X5) no mercado americano e europeu. Esta edição ‘abriu as portas’ à edição de “Overdose” e da (semi-)colectânea “Made in USA”, o album que revela a banda ao mundo, sobretudo com os hits “Twiggy Twiggy” e “Go Go Dancer”, vendendo 200.000 exemplares no mundo inteiro, um feito notável para uma banda japonesa (e que canta em japonês na maior parte das vezes).

Com o começo do sucesso internacional da banda, Keitaro Takanami desiste do projecto, tendo os restantes P5 assumindo o formato de duo para fazer uma tour pelos EUA e Europa em Fevereiro de 1995. Entretanto dá-se o ‘boom’ do Pop Shibuya-key, com vários artistas nipónicos a ganharem relevo internacional. Os exemplos mais conhecidos serão os de Kahimi Karie, revelada na Europa através da edição da colectânea “Sushi 3003, Spectacular Japanese Clubpop” da label alemã Bungalow (uma das principais divulgadoras de pop indie japonês na Europa), e Cornelius, que editou um dos álbuns de referência dos anos 90, “Fantasma” pela Matador, tornando-se um dos músicos nipónicos mais influentes dessa década.

Quase simultaneamente Konishi ganha o estatuto de ‘Guru’ do movimento, apoiando e produzindo vários projectos, muitos editados pela primeira vez na Europa na já citada “Shushi 3003” (e na posterior “Shushi 4004”, ambos projectos de Konishi). Durante a tour europeia encontra diversos projectos sonoros com influências semelhantes ou influenciadas directamente pelo Shibuya-key, algo que revelou o interesse nos P5 que participarem em variados projectos paralelos e a utilizar o legado da banda nos anos 80, sendo esta uma fase muito marcada pelo carregado uso de samples dos ‘antigos’ P5 e por dar uma ‘roupagem nova’ a muitas das antigas faixas de referência da banda, reeditadas em sucessivos EPs e albuns a partir de 1995. Por essa altura Nomiya Maki começa a ficar menos disponível para a ocupada agenda da banda, devido ao nascimento do seu primeiro filho, o que permitiu a Konishi fazer mais uma reciclagem intensa da carreira pré-anos 90, o que explicará também estas sucessivas reedições e remisturas de vários álbuns nos anos seguintes.

Nesta altura notava-se de forma clara que a carreira da banda estaria a viver uma pausa que, embora sem muitas novas edições de material inédito, permitiu através das várias reedições (muitas vezes empacotadas em luxuosas embalagens) fazer crescer, sobretudo nos EUA e na Europa, uma considerável base de incondicionais fans da banda, que se reviam na atitude de ‘sofisticação Kitsch’ dos P5. A crítica, embora nem sempre consensual, acompanhou essa vaga, dividindo-se entre considerar a banda como realmente uma das maiores bandas “alternativas” da altura (como relatado num artigo da Rolling Stone aquando a edição de “Made in USA”), como simultaneamente considerando os P5 como sendo apenas uma curiosidade musical bastante positiva na valorização de elementos retro, mas com uma ‘duvidosa’ existência criativa. Mas mesmo as críticas menos favoráveis à banda realçavam a ‘lufada de ar fresco’ que esta sonoridade trouxe ao Pop da década de 90 e a alguma vertentes da Club Culture.

Os álbuns de originais entre 1997 e 2000 consolidaram a ‘fórmula P5’, revelando uma banda cada vez mais requintada na produção e na composição, que simultaneamente agrada os fãs mas também encontra um generoso ‘nicho de mercado’ mais generalizado que aumentou também o uso de algumas canções do (agora) duo em vários trabalhos comerciais, sobretudo no campo da publicidade.

Em 2001 a banda anunciou que “Cà Et Là Du Japon” seria o último album da banda, terminando a carreira com uma série de eventos e concertos onde participaram também muitos dos antigos membros que passaram pelos P5. Ambos os membros, agora já sem terem que manter a banda, continuaram projectos que já mantinham nos anos precedentes.

Nomiya Maki, agora um ‘ícon cultural’ influente, dedicou-se a vários projectos interdisciplinares, combinando aparências ao vivo, produções de moda (Mini She by Maki Nomiya), uma carreira musical, quer a solo, quer com o projecto (de performance) Oui Oui e escritora de livros sobre ‘life style’, sendo ainda hoje uma figura conhecida da Club Scene e da indústria da Moda no Japão e nos EUA.

Por sua vez Yasuharu Konishi continua ainda hoje a produzir variadas bandas e projectos musicais (Tokio Coolest Combo, Kyoko Fukada and the 2 Tones, Mari Natsuki entre muitos outros), a remisturar muitos temas de outros projectos e a lançar alguns dos seus projectos musicais em variadas colectâneas internacionais e alguns álbuns de originais e compilações pessoais.

Para trás ficou uma obra bastante recheada de magníficas canções pop, bastante diversificada, mas sempre com uma marca vincada. A forma como os P5, através da exposição internacional da sua obra, marcaram a música actual estará ainda por definir, dividindo-se as opiniões. Enquanto muitos consideram esta banda como uma das mais ‘inovadoras’ na forma de reciclar diversas influências Pop do passado, ainda existem muitos que consideram os P5 como apenas uma banda que causou um pequeno abalo na Pop dos 90, mas que não deixou consequências.

Mas existe um facto que é inegável: os Pizzicato Five abriram as portas a muitos apreciadores de Pop a descobrirem o que estaria a acontecer musicalmente no Japão nos finais dos anos 90, fazendo também crescer um interesse por vários movimentos e tendências musicais internacionais dos anos 60, que marcaram muitos dos constantes revivalismos que temos assistido nos últimos 10 anos.

Discografia

1985: Audrey Hepburn Complex (single)
1986: In Action (AKA Pizzicato Five in Action)
1987: Couples; Pizzicatomania
1988: Bellissima!
1989: By Her Majesty’s Request
1990: Soft Landing on the Moon; Lover’s Rock
1991: This Year’s Model (EP); London-Paris-Tokyo (EP); Readymade Recordings (EP live); This Year’s Girl
1992: Sweet Pizzicato Five; Pizzicato Free Soul (2 LP)
1993: Instant Replay (live); Sweet Soul Revue; Bossa Nova 2001; Souvenir 2001; Expo 2001; Free soul 2001 (2 LP)
1994: A Television’s Workshop (EP); Overdose; Made in USA; Five By Five (EP)
1995: TYO: Big Hits & Jet Lags 1991-1995; Quickie #1 (EP, Out of Print); Quickie #2 (EP, Out of Print); Happy Sad / Unzipped (EP); Romantique 96; The Sound of Music; A Quiet Couple (versões intrumentais de Couples); Antique 96; Non-Standard Years ’85-’86
1996: Combinaison Spaciale; Sister Freedom Tapes; Great White Wonder: Rare Masters 1990-1996
1997: Happy End of the World; Porno 3003 (EP); Mon Amour Tokyo (EP); Big Hits & Jet Lags 1994-1997; Mon Amour Tokyo 2 (EP);
1998: Readymade Records Remixes; Remix Album – Happy End of You; The International Playboy & Playgirl Record (AKA Playboy & Playgirl); Pizzicatomania! (reedição)
1999: Darlin’ of Discotheque (EP); Nonstop to Tokyo (EP); Perfect World (EP); Pizzicato Five (TM) (AKA Pizzicato Five)
2000: Remix 2000; Overdose (reedição); Bossa Nova 2001 (reedição); Romantique 96 (reedição); Sweet Pizzicato Five (reedição); This Year’s Girl (reedição); Voyage a Tokyo (EP); The Fifth Release From Matador
2001: Cà Et Là Du Japon ; Pizzicato Five R.I.P.: Big Hits & Jetlags 1998-2000
2004: Band of the 20th Century: Sony Years, 1988-1990

Nota:
Esta lista é apenas uma ‘discografia elementar’ e não uma listagem completa, tendo sido recolhida entre várias fontes, nem sempre concensuais, mas seguras e oficiais. São aqui listados apenas os lançamentos ‘centrais’ da banda, excluindo inúmeros bootlegs e bandas sonoras para televisão e algumas obras com lançamento restrito (promos e raridades sem lançamento comercial generalizado). Existem também algumas colectâneas de tributo aos P5 (de outros artistas) que não estão incluidas nesta lista, mas que deverão suscitar o interesse dos fans mais “ardcore” e a que aconselho a procura.

Escrito por: Nuno Barradas

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