Incesto. Eu digo outra vez. Incesto. É muito fácil mostrar uma relação amorosa entre dois irmãos – veja-se Angel Sanctuary ou Onegai Twins -, mas não é nada fácil que ela ataque, doa, faça o corpo contorcer-se enquanto repensamos em valores e normas e tentamos encaixá-los no que vemos, um amor, puro, mas entre Koshiro e Nanoka, irmãos com 12 anos de diferença, tantos quantos aqueles em que não se viram. É nesta vasta área da moral que Koi Kaze irrompe como nenhum outro anime dentro do género romance e nesse sentido é um verdadeiro diamante por lapidar.
Comecemos pelo melhor. O que brilha na série são as personagens. Além de um fantástico Koshiro, que é, ao início, uma personagem irritante pela brusquidão com que lida com a irmã mais nova, temos uma Nanoka (que nome delicioso) a fazer de contrapeso à incapacidade do irmão em manifestar os seus sentimentos. Pelo contrário, ela é viva e doce, transborda uma sinceridade que o conquista. Será que ela se apercebe? Ela percebe tanto que por vezes, pensamos em quem é verdadeiramente o adulto e quem é a criança. Nanoka, 15 anos, já aprendeu a dizer “Amo-te”, Koshiro 27, ainda não. Por altura do 3º episódio, pensamos “mais 10 episódios sobre uma relação entre dois irmãos? Não é possível.” Sim, é e ainda bem porque raramente se vêem personalidades tão fortes a interagir de uma forma tão realista como em Koi Kaze.
Em plano secundário, temos os personagens que fazem a trama avançar (não é à toa, aliás, que é uma delas, Chidori, que influencia a decisão final). Futaba, colega de escola de Nanoka, é uma amiga leal e compreensiva que instiga, inconscientemente, Nanoka a definir os seus sentimentos. Chidori e Kei são os colegas de trabalho de Koshiro. Ela, uma peça fundamental, representando a censura da sociedade, chama-o de tarado e pedófilo, mas é na sua atitude de semi-interesse amoroso que provoca também um Koshiro mais assertivo e honesto consigo próprio. Kei é o típico pervertido “lolicon”, personagem dispensável, não fosse para aliviar um pouco o peso da série.
A animação é, ao mesmo tempo, um dos pontos mais fracos e mais fortes da série. Koi Kaze foi, obviamente, produzida com baixo orçamento o que explica a animação cheia de falhas como os movimentos pouco naturais das personagens a andar e a falar e mesmo o “character design”, sobretudo de Koshiro já que a Nanoka é simplesmente adorável. Os edifícios e ambientes em aguarela são harmoniosos e agradáveis, apesar de muito simples. Nos episódios 8 (que nem sequer passou na televisão japonesa por lidar com um assunto ainda tabu, o divórcio) e 9 a animação decresce vertiginosamente de qualidade, mas ao contrário do Kimi Ga Nozumu Eien que fazia da qualidade excepcional da animação um dos seus pontos fortes, em Koi Kaze não há essa preocupação, e, sinceramente, passa-se bem sem isso.
Já o “voice acting” causa alguma irritação com o “seyuu” de Koshiro a ser muito mal escolhido. Vezes há em que o que a personagem diz nada tem a ver com o tom com que é dito e, de uma maneira geral, a voz não se adequa à personalidade de Koshiro. Já a “seyuu” de Nanoka está bastante bem, transmitindo a ideia de que ela é madura, apesar da idade. Quanto aos restantes, são sofríveis, muito sofríveis. Já a música adequa-se à série, quer dizer, encaixa perfeitamente no tom e ambiente ao longo dos 13 episódios, mas não poderia sobreviver como unidade independente das imagens.
Koi Kaze é um anime não recomendável a pessoas com pouco estômago para enfrentar tabus há séculos implantados e enraizados nas nossas mentes com cultura judaico-cristã, falando de nós, ocidentais, tal como pouco indicado a membros do PNR e derivados. Agora se gostam de assistir a um romance subtil, doce, mas sem enjoar, nada sentimentalóide ou muito pouco (vá esse pouco é mesmo, mesmo no final), com personagens realistas e sem cabelos azuis ou verdes, se querem enfrentar medos e suposições de vida a preto e branco, então Koi Kaze é, sem dúvida, para vocês.
Escrito por: Margarida Ponte