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[ENTREVISTA] : Get Your Genki

Nos anos 90 houve uma editora na Alemanha que adorava a música japonesa e editava muitos artistas do movimento Shibuya-kei. Passaram-se quase três décadas e o país da Manshaft volta a ter uma editora que adora a música feita no país do Sol Nascente. Essa editora é a Get Your Genki que até ao momento já lançou mais de 15 edições em cassette, cd e vinil.
O ClubOtaku entrevistou o dono da GYG e fica aqui a conversa:

O que te inspirou a criar o Get Your Genki e como surgiu a ideia de promover música japonesa internacionalmente?
Esta é na verdade uma longa história, mas vou resumir:
Há muito tempo que procurava compilações de músicas do Japão em CD, vinil ou cassete, porque, afinal, existem imensas compilações de todos os géneros e bandas, especialmente do lado ocidental do mundo.

Mas como sou fã de música japonesa há muito tempo, fiquei mesmo desiludido por haver tão poucas. Já existiam CDs com os maiores êxitos dos anos 80 ou 90, etc., mas eu interessava-me mais pelo rock/punk/indie. Quando comecei a investigar mais a fundo, fiquei surpreendido com a quantidade de editoras que simplesmente copiavam músicas do YouTube ou de outras plataformas e prensavam-nas em CD para disponibilizarem essas compilações ao público. Ou seja, nem sequer pediam autorização às bandas.

Também não queria apoiar esse tipo de pirataria, por isso pensei: se ninguém o faz, então vou ter de o fazer eu! E com o consentimento das bandas participantes, que podem decidir qual a música que entra na compilação e sabem exatamente com quem estão a lidar.
E pronto, a partir daí tudo aconteceu muito rapidamente.

Como descobres novos artistas para incluir nas tuas compilações? Procuras algum género ou sonoridade em específico?
Isso foi um problema no início: primeiro tive de explicar às bandas quem eu era e o que pretendia fazer. E claro, muitas bandas japonesas estavam desconfiadas quanto ao que estes alemães estranhos andavam a fazer. Até porque algumas editoras queriam comprar os direitos das músicas dessas bandas… pelo preço de umas cervejas, claro!

Na altura, já usava o MySpace (ainda existe, e ainda há lá bandas fantásticas para descobrir), mas quando o Twitter começou a tornar-se mais relevante, foi aí que comecei a encontrar e a contactar a maioria das bandas — também através do Bandcamp.
Como tenho mais inclinação para o rock e punk, foi por aí que comecei a procurar. Mas também havia muitas bandas que, desde o início, pensei: tenho mesmo de lhes perguntar!

No entanto, tenho um gosto bastante variado. O mais importante é que a música me toque de alguma forma… e o género em si não importa muito! Além disso, tento sempre garantir diversidade nas compilações. Não tanto para “ter algo para todos”, mas para mostrar a incrível variedade da música independente japonesa.

As cenas indie e underground japonesas são incrivelmente diversas. Que tendências ou mudanças tens observado nos últimos anos?
É incrível como a música indie é diversa no Japão; há muito menos disso na Alemanha.

Mas infelizmente, tenho notado que muitas bandas se adaptam aos hábitos de audição ocidentais logo desde o início, ou bastante rapidamente. Géneros como o KAWAII METAL estão a tornar-se cada vez mais populares. Miúdas adolescentes a cantar refrões pop, com o resto da música bastante virado para o metal… mas tudo com uma abordagem muito comercial. É uma pena ver tantas bandas — especialmente na cena indie — a seguir essa moda.

Sobretudo quando não se tem uma editora por trás e não há pressões externas, as bandas podiam manter-se fiéis às suas ideias originais… mas muitas acabam por tentar… agradar, o que é mesmo triste. Fico mesmo chocado às vezes quando ouço o primeiro álbum de uma banda totalmente tola e penso: “uau, uma banda de jazz-noise-metal, isto é mesmo interessante.” E depois, com o segundo álbum, penso: “isto é a nova Babymetal?”

Muitos ouvintes ocidentais não conhecem os artistas e bandas indie japonesas. Como tornas essa música acessível e apelativa para um público global?
Boa pergunta!!! Pensei bastante nisso no início, sobre qual seria a melhor forma de abordar a questão. E aqui voltamos à perspectiva ocidental: devia procurar bandas que agradassem mais aos ouvidos ocidentais?

NÃO! Esta é a minha editora, onde lanço bandas e músicas de que gosto (e onde as bandas dão o seu consentimento). Por isso, os ouvintes têm de se esforçar um bocadinho e ouvir as minhas músicas favoritas. No entanto, acontece que algumas bandas me disponibilizam todo o seu catálogo e dizem: “Christian, escolhe tu a música, estamos bem com qualquer uma.” Nesses casos, a minha favorita pode não ser a que acaba por entrar na compilação. Tento encontrar uma música que seja mais… compatível. Não quero sujeitar ninguém a uma explosão drone de 20 minutos.

As tuas compilações abrangem vários estilos. Como escolhes as faixas para manter uma experiência de audição coesa?
Pode não parecer, mas não é nada fácil! Como as músicas são lançadas em cassete, tenho primeiro de dividir aproximadamente o tempo total de reprodução em duas partes. Depois tento sempre encontrar uma boa música de abertura, uma boa para encerrar o lado A, e o mesmo para o lado B.

Às vezes corre muito bem e resolvo tudo em 30 minutos, mas outras vezes demoro 4 ou 5 dias! Quero que soe um pouco orgânico, e se uma música de metal terminar com sintetizadores, a próxima — que pode ser uma música folk — pode começar com sintetizadores também.
Mesmo que não se note, coloco muito tempo e atenção na ordem das músicas!

Quais os desafios que enfrentas ao gerir uma editora independente focada em música internacional de nicho e como os superaste?
Ui, houve (e ainda há) tantos obstáculos que nem sei por onde começar!
Talvez alguns exemplos: Quando fundei a editora, ficou claro que tinha de gerar algum rendimento. Não posso simplesmente pagar pelas cassetes e pelos custos do servidor do meu bolso. Mas também tenho uma espécie de missão.

Não quero lucrar com a editora; fico perfeitamente satisfeito se tudo ficar em equilíbrio. Por isso, pago tudo adiantado — produção, designers, etc. — e depois calculo o preço de venda com base nas cassetes produzidas. Nunca compensa realmente, mas estou bem com isso.
Mas quando entra dinheiro e é um negócio registado (como deve ser na Alemanha), o sistema fiscal entra logo em cena. E mesmo já tendo convencido as finanças de que não tenho lucro — ou seja, é mais um hobby — tenho de fazer declaração de impostos todos os anos e provar que não ganhei dinheiro. É um verdadeiro pesadelo!

Outro problema, claro, é convencer as bandas que gostaria de incluir nas compilações. Primeiro há a barreira linguística, depois o ceticismo — mais do que justificado — das bandas (imagina uma editora do Japão a contactar uma banda indie de Portugal a perguntar se quer participar numa compilação), e depois o facto de eu não conseguir pagar nada!

Cada banda recebe uma cassete gratuita enviada para o Japão e tantos códigos de download quanto quiser, mas não consigo oferecer muito mais que isso. Hoje em dia, já conquistei alguma credibilidade; o nome começa a espalhar-se e há quem saiba quem sou e o que faço, e que sou mais um fã maluco do que alguém a tentar enganar bandas.

E depois há o problema: como é que promovo isto tudo… e ainda me pergunto isso 🙂 Já fiz muita coisa, estive em revistas, dei entrevistas a estações de rádio, etc. Estou contente com o estado atual das coisas, mas sem a minha base fiel de fãs, isto não seria nada!
Por isso, a todos os meus seguidores e apoiantes: muito obrigado!!!!!

Podes falar-nos de um artista ou lançamento em particular que tenha um lugar especial na história da Get Your Genki?
Na verdade, há vários. Ainda estou em contacto com alguns deles, mesmo passado bastante tempo, e mantemo-nos atualizados sobre as nossas atividades. Por exemplo: ひねもす大臣 & The HouseRockers, UNCLE JOHN, N16, dutch money(s) e Yoshikostonepair.

Como tem sido a recepção por parte do público internacional e dos artistas japoneses com quem colaboras?
Infelizmente, estou a produzir um bocado “às cegas”, há pouca resposta.
Mas parece que a maioria das pessoas gosta do que faço, porque há fãs dedicados que compraram todos os lançamentos até agora.
As bandas, por sua vez, costumam ficar entusiasmadas e muitas vezes recomendam-me a outros, o que, claro, me deixa muito feliz!

Por fim, que mensagem gostarias de deixar aos novos ouvintes que estão a descobrir música japonesa através da Get Your Genki?
Muito obrigado por dedicarem tempo a ouvir as minhas compilações!
Espero que gostem do que ouvem e, claro, fico sempre contente com reações — tanto positivas como negativas.
E se compraram uma ou outra compilação: muito obrigado por apoiarem a música independente do Japão. É graças a vocês que consigo descobrir mais bandas fantásticas e, com a aprovação delas, incluí-las nas próximas compilações.

Entrevista efectuada via email por: Fernando Ferreira

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